quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Passos em direção a luz

  Os seus passos ecoavam pelo corredor comprido.  Por mais que tivesse passos leves, era impossível que em tais circunstâncias não fizessem barulho. Andava descalça. Havia tirado suas sapatilhas pois apertavam seus pés e não a deixavam pensar. Era bom sentir o chão gelado na sola dos pés após um dia tão quente. Seus pensamentos estavam ali, nos pés. Em um local tão gélido, mesmo com o calor que fazia lá fora, tão escuro e tão solitário, era difícil não pensar nas únicas duas coisas que faziam barulho lá: seus pés.
 Ora corria, ora andava devagar para sentir melhor o solo. Logo, deu-se conta da sua respiração ofegante e começou a ritmá-la, tentando recuperar a calmaria ao seu redor. Sentia-se bem naquela situação, na qual todo o seu mundo havia se liquefeito, e seus pensamentos estavam concentrados em um som tão simples, e uma sensação tão prazerosa. Sentia-se livre. Livre por estar com os pés no chão, sem ninguém a repreendendo por haver a possibilidade de pegar uma gripe. Livre por não haverem problemas, e sua única preocupação seja controlar a sua respiração, para que haja mais silêncio.
  Silêncio. Há quanto tempo não o ouvia? Não sabia nem ao menos se ainda existia. O barulho, assim como sapatos apertados, atrapalhavam seus pensamentos, e ela gostava de pensar. Perdia seus olhos na imensidão de seu próprio ser, e pensava. Em tudo, e em nada. Em genialidades e em babaquices. Apenas pensava. E talvez, a última vez que tivesse ouvido o silêncio, tenha sido também a primeira e única durante a sua vida, quando estava ainda no ventre da sua mãe. Mas era um silêncio diferente, reconfortante. E agora,  um silêncio gélido, em um corredor escuro e solitário.
  Viu então, uma luz. E a medida que ia caminhando em direção a ela, sentia seu calor. Um calor aconchegante, o mesmo do ventre de sua mãe. Aquele calor a atraia, aquela luz, que não era ofuscante, mas sim a luz de um amanhecer em um dia com o céu limpo, a encantava. Começou a correr desesperada, ansiosa. Já não se tinha mais silêncio, mas sim, seus passos descompassados, e sua respiração desritmada. E a luz nunca chegava, ao contrário, parecia se afastar. Logo já não haviam somente seus passos e sua respiração, mas também, vozes. Gritando, felizes, desesperadas, em uma excitação incontrolável. Um barulho eletrônico acelerado, e logo uma luz. Mas não aquela luz, essa era ofuscante, quase insuportável. E então, ouviu sua respiração ritmada novamente, e o barulho eletrônico marcando seus batimentos cardíacos controlados. Quando seus olhos se acostumaram com a claridade outra vez, viu os rostos conhecidos lhe sorrindo. Estava no barulho novamente. Estava viva. E seus pés poderiam tocar o chão outra vez.

domingo, 19 de agosto de 2012

Melancolia escrita

  Seu escritório era escuro. Havia somente uma luminária em sua escrivaninha, forte o suficiente apenas para iluminar a máquina de escrever. Sim, ele conhecia a tecnologia chamada computação, mas não achava magia alguma em escrever com a correção automática do Word. Além da máquina de escrever, um copo de whisky e um cinzeiro emanando fumaça de cigarro faziam companhia aquele escritor excêntrico.
  "Medos que envolvem meu corpo e degradam minha alma, fazem com que eu passe a não acreditar mais em minha própria realidade" Não costumava escrever frases mórbidas como a anterior. Todavia hoje, seu interior estava excepcionalmente degradado. Perturbado com a sua incapacidade emocional, abandonou a sua companheira e foi até a porta de seu apartamento. Saiu sem rumo, com os olhos perdidos acompanhando inconscientemente aquela vasta imensidão. Como se era de se esperar de um dia nublado, começou a chover. Ele não ligou. Continuou a caminhar, como se não houvesse destino.
  Apenas parou quando avistou um bar. Já estava anoitecendo aquela altura. Entrou no estabelecimento, e sentou em uma mesa qualquer ao fundo. Tocava uma banda de blues, para acompanhar sua melancolia. Pediu uma dose de whisky, e lembrou de seu último cigarro no bolso. Permaneceu ali, então, apreciando aquele momento nostálgico, em que lembranças dolorosas passavam em sua mente.
  - Ainda dói?
  - Desculpe, o que disse? - Perguntou assutado, após acordar de seus devaneios.
  - Ah, devo tê-lo assutado. Perguntei se ainda doía.
  - Dói. Sempre dói, sempre há algo para doer, não?
  - Poeta? Não. Escritor? Você tem jeito de escritor.
  - Sim.
  - O que faz aqui em uma noite chuvosa dessas? É sábado a noite, um homem com a sua idade deveria estar com a  família... - O escritor virou o rosto - Ah... Você não tem família...
  - Você poderia, por favor, retirar-se?
  - Desculpe, não queria atormentá-lo. Eu queria apenas fazer companhia a alguém que está emanando melancolia.
  - Tanto faz.
  - Resposta curta para um escritor. Sua mulher foi assassinada, não foi?
  - É.
  - Você presenciou?
  - Sim.
  - Filhos?
  - Uma menina.
  - Faz quanto tempo?
  - Hoje fazem15 anos. Minha mulher foi assassinada de uma maneira brutal, sem que eu pudesse fazer nada. E minha filha, de apenas cinco anos, levada, sabe-se lá para onde.
  - Pois eu sei o destino dela. E ele se cruzou com o seu... - Olhou para o relógio - Há mais ou menos vinte minutos atrás.
   A garota sorriu da maneira mais doce que o escritor já viu, e a melancolia se esvaiu.



terça-feira, 14 de agosto de 2012

Inspiração musical do dia

(Leonardo Augusto/Filhos Bastardos)

Banda  Os Dois - Leonardo Augusto e Lucas Ariel
Música: Filhos Bastardos - Letra e música: Leonardo Augusto
Melhor letra e melhor banda do Festival da Canção da Fundação Liberato!

Nota: Sem bajulações, mas também, sem meias palavras: esse cara é foda pra caralho. Ele estuda na mesma escola que eu, é um nanico, mas quando entra no palco cresce de tal forma que se torna insuperável. Eu lhe admiro muito, pelo seu talento e pela sua humildade. Enfim, chega de "nhénhénhé", aproveitem.

quinta-feira, 9 de agosto de 2012

Hina Sword

  Estava pronta para mais uma guerra. A armadura posta, e as armas ao seu alcance. Hoje seria a pior de todas, teria de enfrentar os monstros que já foram seus iguais com seus olhos vermelhos e assustadores. Sua armadura era sua melhor roupa, juntamente com o lápis preto fortemente traçado para destacar seus olhos. Suas armas eram suas palavras, seu sorriso e seu olhar. E os monstros eram as pessoas ao seu redor. Aquelas que um dia já a acompanharam nas conversas, gargalhadas e bobagens. Mas hoje, viraram os monstros traidores, contaminados pelo vírus do ódio. Aquele vírus, que ela sabe, foi ela mesma quem criou.
  A guerra repetia-se todos os dias, porém, nem todas as batalhas ela tinha força para encarar. Havia dias em que deixava sua armadura no seu forte, e outros em que preferia não usar suas armas. Calava-se, e se escondia em lugares onde os olhos inimigos não a pudessem ver. Para a sorte da guerreira, seu cavaleiro negro estava sempre lá para protege-la. Ele usava da melhor arma que dispunha: o abraço. A guerreira virava princesa, e deixava com que as lágrimas doces brotassem em seus olhos e rolassem pela face. Ele a fazia sorrir, e quando a princesa levantava o rosto, já tornara-se guerreira novamente.
  Todavia hoje, após muitos dias de fraqueza, a guerreira voltaria a lutar. Com sua armadura e suas armas. Não se deixaria abater, pois a guerra ainda não terminara. E ela continuará a lutar, contra os monstros que ela mesma criou, ao lado de seu cavaleiro negro. Pondo-se posta ao que vier, pequenas ou grandes batalhas, pois a força estava ao seu lado. A força era ela. Continuaria a lutar, por todos os dias de sua vida.


segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Ditadura literária

  Proposta de português. "Faça um texto comparando as gerações" disse a professora. Ponho-me a escrever. A lapiseira em mãos, e nada mais. Se eu errar, eu risco, nada de apagar. O que foi escrito tem de ficar ali. As palavras saem fervorosas, confiantes, conscientes. Tratam de tabus quebrados, conceitos derrubados, e preconceitos esquecidos. "Não está bom" disse a professora.
  Regra número um quebrada: tudo foi apagado. A folha sem espaço, agora ficou marcada pelo traço firme de uma mão pesada. Volto a escrever. Dessa vez mais objetiva, mais específica. As palavras já não são tão confiantes, conscientes, são produto de um planejamento. Tudo que quero dizer, já não é mais dito. Começo a moldar uma opinião. "Não está bom" disse a professora.
  Agora é uma questão de honra. Já não pego mais a lapiseira, escolho a caneta azul para contrastar com as linhas pretas. Escrevo algo que não me cabe, mas agora já não há mais tempo. Deixo os versos bonitos de lado, as inversões de frase, e até a minha opinião. Não aceito, e não gosto do que estou escrevendo, mas são as regras. Tenho de obedecer. Não me importo mais com a opinião da professora. Entrego o pequeno parágrafo, e digo um singelo "Tchau Sora".
  E de que adianta escrever para se expressar, se minhas expressões não agradam a gramática? Suas regras, suas estipulações, e o que eu ganho? Um "Não está bom"? Entrego-me a essa ditadura literária, porém por pouco tempo. Saio da sala, e penso comigo "Foda-se a gramática".

domingo, 5 de agosto de 2012

Inspiração musical do dia


Ouvi isso acidentalmente na TV hoje, e obviamente reconheci a minha querida Nothing Else Matters. Porém, não era simplesmente a música genial tocada pela Metallica, era uma versão no violoncelo. E agora estou aqui, após ter garimpado ela no You Tube, compartilhando-a com vocês. Apreciem.
Beijo na massa encefálica.

sábado, 4 de agosto de 2012

Ironias temporais

  As vezes a gente pensa em como o tempo passa rápido. Eu sempre soube disso, entende? Sabia que tinha pouco tempo para muita coisa. Mas o que para os outros é apenas um ditado popular, ("nossa, como o tempo passa rápido") para mim é um pesadelo. Olho para o histórico do blog, e vejo os anos que se   passaram, e o quanto minha cabeça mudou desde o início, quando ainda nem existia o atual título do blog.
  Desde lá, muitas coisas aconteceram, muitos fatos se sucederam, e percebe-se cada sentimento meu nas palavras que escrevi. Talvez algum de vocês (muito provavelmente, aliás) já tenha sido o motivo de meus textos, ou tenha sido coadjuvante das minhas histórias, de qualquer forma, estava lá. Me amando, me odiando, ou somente existindo, sinto me agradecida por você ter me inspirado, e honrada por tê-lo presente aqui de alguma forma.
  Todavia, voltando ao assunto principal do texto, também me sinto de certa forma feliz pelo tempo que passou e está passando. Dizem que o tempo cura tudo, mas o tempo não cura porra nenhuma. Quem cura é você, usando do tempo apenas como aliado. E eu usei. Usei da linha temporal, aproveitando cada segundo para que nada fosse feito sem pensar. E não falo de fazer coisas erradas (seja lá o que você considere como errado), nem de fazer o que se tem vontade. Falo de ser feliz, mesmo. Sempre caminhar a favor da felicidade, com paciência, acompanhando o ciclo natural diário. E o tempo faz com que o presente não se torne eterno, o que pode ser visto como ruim, entretanto é exatamente o contrário. Todo e qualquer momento deve ser vivido e aproveitado. Desde o primeiro beijo, até o primeiro comprimido de Viagra.
  Mas enfim, minha professora ensinou (e a sua também) que devemos concluir os textos dissertativos, porém, aqui fica sua deixa para tirar suas próprias conclusões. Pense, a ditadura acabou faz tempo.
  Beijo no umbigo, até mais.