sexta-feira, 14 de março de 2014

Carta de uma mente perdida

   Me chamo Bárbara. Bárbara Hunter. Não sou alguém exatamente familiar, morei por quinze anos com meus pais, mas por uma ironia do destino tive que sair da nossa casa. Infelizmente meu sobrenome vem do meu pai, Augusto Hunter. Hoje, apesar de não gostar do sobrenome, ao pronunciá-lo, me vem o doce sabor de sangue a boca.
   Antes de tudo acontecer me chamavam de Babi, e quem diria que tal doce garota se mostraria tão cruel. Não acredito em entidades, a fé já me abandonou faz tempo. Assim como minha mãe, descobri que chamar por um Deus não salva ninguém.
   Minha mãe era a mulher mais linda que conheci, nesse ponto somos parecidas, porém apenas nesse. Minha personalidade busquei em meu pai. Eu provavelmente sou mais forte que ele. Apesar de cruel, um homem que atinge pessoas tão indefesas, não pode ser considerado forte. Por sorte não tive irmãos, possivelmente porque meu pai não os queria. Eu fui um acidente.
   Hoje eu gostaria de poder mudar tudo o que fiz. Eu realmente amo minha coragem, mas minha vida é paranoica, psicótica, uma mentira. As pessoas me vêem como uma garota correta. Também pudera, curso engenharia na faculdade e sempre ando com um livro de romance nos braços. Todos os dias vou ao café esconder-me da solidão. Eu não conseguiria morar com outra pessoa. Eu faria tudo outra vez.
   Minha vontade é voltar no tempo. Sonho todas as noites com aquele momento. Eu poderia ter feito diferente, ter evitado. Gostaria de poder esquecer e ser simplesmente uma garota normal. Mesmo cursando engenharia, e sendo boa como sou, fazer isso pelo resto da minha vida iria me enlouquecer. As repetições e fazer dia após dia a mesma coisa, me matariam aos poucos. Entretanto, é preciso manter as aparências. Eu gostaria de ser livre, de agir da forma politicamente incorreta, mas isso faria mal a muitas pessoas. Tenho que me controlar.
   Por que? Porque eu matei meus pais. Porque era insuportável ouvir todos os dias meu pai batendo na minha mãe depois de chegar bêbado em casa. Minha mãe era fraca, nunca foi um exemplo para mim. Não tive exemplos. Como se já não bastasse, quando fiz quinze anos meu pai começou a me notar, não como pai é claro. Eu queria morrer, então eu os matei. Apenas um dia fora de casa, uma válvula de gás estranhamente aberta e fim.
   No entanto, eles sabiam que tinha sido eu. Eu sabia, eu tinha certeza que quando me olhavam estavam me acusando. Perdi o controle e então perdi todos aqueles que estavam ao meu redor. Tive que sair dali, fugir. Me escondi em outra cidade, comecei uma nova vida. Tentei esquecer tudo que aconteceu. E realmente as coisas melhoraram, porém ainda quando me olham nos olhos eu sei, eu tenho certeza, que eles sabem o que eu fiz, e novamente, eu enlouqueço.

sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

Crise dos dezoito

  As vezes eu me pergunto se estou seguindo o caminho certo. Saber que estou estudando para ter um futuro melhor me incomoda. É como se a cada passo estivesse garantindo os meus dias antes da morte, onde precisarei que os outros cuidem de mim.
  Temos que estudar, ir bem na escola, passar de ano, garantir uma profissão. Por que? Para um cara vir e lhe oferecer trezentos reais por mês que não paga nem a comida que eu como? Eu vejo pessoas que largaram os estudos no meio do caminho, e hoje são melhores sucedidas que aqueles que se foderam estudando cálculos na engenharia. E eu ainda me presto a acreditar que dias melhores estão por vir. E o que queremos? Um emprego de quatro mil reais por mês, ou viver na praia ganhando pouco, vivendo de fazer tatuagens de henna?
   Eu não quero viver presa! Eu quero poder me tatuar sem ter medo de que uns ordinários preconceituosos olhem na minha cara e me julguem incapaz. Eu quero poder colocar piercings sem me preocupar se aos olhos fúteis vou parecer "poluída". Quero usar cabelo colorido sem dizerem para mim que isso "é coisa de jovem". Quero ser eu mesma, num mundo onde os padrões de vida nos prendem em um eterno nascer para estudar, estudar para trabalhar, e trabalhar para morrer.
   Quero morar num canto, desde que a felicidade more junto comigo. Quero poder amar sem fronteiras, fazer o que gosto, e ser quem eu quero ser. E principalmente não quero ter de deixar de lado meu espírito jovem porque já está na hora de ser adulta e cumprir com as minhas responsabilidades.