sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Um conto de pessoas comuns - Capítulo III


  Os dias foram passando. Dias chuvosos, dias apenas frios, de que importava? Alice estava feliz por passar 15 minutos da sua manhã com aquele garoto incrível. Conversavam sobre tudo, o que haviam feito no dia anterior, o que fariam naquele dia. Conversavam sobre livros, filmes, música. Aos poucos ele foi se tornando um cúmplice para Alice, que contava a ele seus problemas e tristezas, e também suas alegrias, e vitórias. Ele sabia muito sobre ela, e ela, apesar de não notar, quase nada sobre ele. Chamava-se Henrique, era dois anos mais velho que Alice, um garoto que apreciava a liberdade, e criticava a sociedade em que vivia, era lindo, da maneira que Alice o via.
  Henrique não aparecia todos os dias no ponto de ônibus. Alice não sabia o porquê, e também, nunca se deu ao trabalho de perguntar, e nem ele de explicar. Mas, com o tempo, apesar da aproximação cada vez mais intensa dos dois, a frequência com que se encontravam estava cada vez menor. Alice amava ele, sentia sua falta quando ele não aparecia, e não podia suportar esse angústia de não saber o que acontecia. Em uma das conversas dos dois Alice perguntou:
  - O que está acontecendo? Cada vez aparece menos por aqui.
  - Que bom que perguntou, era sobre isso que queria falar.
  - Então...?
  - Daqui há alguns dias não poderei mais vir vê-la.
  - Mas por que?
  - O motivo não importa, só quero que saiba que eu amo você, apesar de nunca ter acontecido algo entre nós além da amizade. Todos os dias, eu acordava e vinha para cá esperar você chegar, conversava com você, e ia embora.
  - E o ônibus? - perguntou ela surpresa.
  - Eu não precisava do ônibus, não tenho compromisso cedo. O motivo por eu vir aqui todos os dias, era somente ver você. Eu a vi em uma manhã, achei incrivelmente diferente, e passei a vir todos os dias, até ter a oportunidade de me aproximar de você. Quando consegui, nossa, não imagina o quanto fiquei feliz, e quanto mais conhecia você, mais me apaixonava, mais a amava.
  - Então por que não virá mais?
  - Não quero que você, minha pequena, preocupe-se com isso. Quero apenas ver a sua felicidade. Então lembre-se que meu coração estará com você para toda sua vida, mesmo que eu não esteja mais ao seu lado.
  - Mas... Eu não quero me afastar de você. - Lágrimas rolavam eu seu rosto.
  - Eu também não, mas não há escolha. - Beijou-lhe a testa – Agora você tem que ir, seu ônibus já esta aí.
  Alice sentia-se desolada. Henrique não ia mais vê-la, e ela sabia que era para sempre. Quis procurá-lo, então deu-se conta de que não sabia nada sobre ele. O que ele fazia, onde morava. Não tinha sequer algum contato, número de telefone, qualquer coisa. Entrou em desespero, precisava dele, queria ele. Tinha que dizer-lhe que o amava, que sempre amou. Perguntou as pessoas que esperavam o ônibus com ela, mas ninguém ao menos sabia da existência dele. Passou a se perguntar se tudo aquilo não foi um sonho, uma mentira, uma ilusão. Os dias perderam a graça, o inverno parecia sem vida. Tudo que passava diante de seus olhos não era visto. Até o calor aconchegante da lareira pareceu já não fazer diferença.  

quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Um conto de pessoas comuns - Capítulo II


  Esperava ansiosa por um novo encontro, mesmo que não tivesse certeza se ele estaria lá na outra manhã. Mas ela queria que ele estivesse, queria que ele estivesse com ela todas as manhãs dali para frente.  
  Não sabia nada sobre ele, sua idade, seu nome, nem sequer sabia ao certo como era sua aparência, não observou isso. Apenas lembrava do seu sorriso, do seu cheiro que havia ficado nela, mesmo que tivesse usado o casaco por apenas alguns minutos, e da sua companhia, que mesmo em silêncio, foi a melhor, apenas por ele estar ali, e importar-se com ela.
  No dia seguinte, ele não estava lá.   
  E assim foi por alguns dias. Ela tinha a esperança de encontra-lo, sempre vestia-se para ele, preparava diálogos, coisas que julgava interessante comentar, todavia ele não estava lá. Quando já não restavam-lhe motivos para pensar que ele viria, ele apareceu. Ela não pôde conter um sorriso de felicidade quando o viu.
  - Pensei que não fosse mais ver você. - Disse Alice, sem acreditar que havia iniciado a conversa.
  - Pensei que você não sentiria minha falta.
  - Mas senti, não é sempre que alguém preocupa-se comigo, ainda mais sem nem ao menos me conhecer.
  - Ah, eu a conheço.
  - Conhece?
  - Sim, observo você todos os dias. Mas me parece que você está sempre perdida em seus pensamentos, nem deve ter me notado, e eu nunca quis incomoda-la. Entretanto, naquele dia, não pude deixar você tremendo de frio daquela maneira.
  - Obrigada, não imagina o quanto me fez bem.
  - O casaco?
  - Não, a sua companhia.
  E o silêncio pairou no ar, enquanto os dois olhavam nos olhos um do outro. Alice sabia exatamente o que ele sentia, e ela sentia o mesmo.

quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Um conto de pessoas comuns - Capítulo I


  Alice era uma garota comum. Não era esplendorosamente bonita, nem exorbitantemente feia, era simplesmente uma garota, e sua própria aparência tão pouco importava para ela. Uma menina com defeitos e qualidades, dias bons e dias ruins, seguranças e inseguranças. Era muito preocupada com seus estudos e com a família, portanto, quase não se relacionava com outras pessoas além de seus amigos mais próximos, que aliás, ela havia escolhido a dedo.
  Era o início do inverno, não que isso fizesse alguma mudança na rotina de Alice, mas ela adorava aquela estação. Sempre dizia que os ares nostálgicos dos dias chuvosos de inverno, e a lareira aconchegante nos dias frios, davam a ela uma sensação maravilhosa. De qualquer forma, ela seguia sua rotina. Acordar, tomar banho, esperar o ônibus, ir para a escola, estudar, voltar da escola, estudar, tocar algumas músicas no violão, e ir dormir. Entretanto, as coisas se transformaram, assim como o outono se transforma em inverno.
  Em uma manhã chuvosa, Alice fez o que sempre fazia antes de ir a escola. Abriu a porta de sua casa para sair e percebeu que ventada muito, voltou para pegar seu cachecol azul, enrolou-o em seu pescoço de forma desajeitada, e saiu correndo para a rua, para evitar que perdesse o ônibus. Havia esquecido o guarda-chuva, quando chegou ao ponto de ônibus estava completamente molhada e tremia de frio. Desejou então, estar em casa naquele momento, em frente a sua lareira. Contudo, foi despertada de seus devaneios com o aconchego, quando sentiu algo caindo sobre seus ombros. Era um casaco. Por um momento ela ficou paralisada, sem entender o que estava acontecendo, quando notou que alguém olhava para ela com um sorriso simpático.                       
  Nunca havia notado a presença daquela pessoa naquele lugar, e, por um momento, se perguntou se todas aquelas pessoas que estavam presentes, estavam ali todos os dias, e simplesmente ela estava perdida demais em seus pensamentos para perceber. Ela sorriu tímida, e tirou sua mochila de cima do banco, como se oferecendo aquele lugar para o garoto. Ele sentou, e os dois em silêncio, simplesmente desfrutaram da companhia um do outro. Durante o resto do dia, Alice sorriu de uma forma diferente.

terça-feira, 27 de setembro de 2011

Um conto de pessoas comuns - Prólogo


Ele colocou a mão dela sobre a palma da sua própria mão, segurou-a com força e levou as duas mãos ao seu peito, de modo que ela pudesse sentir as batidas de seu coração. O coração dele batia forte. Ela estava olhando diretamente para a sua mão junto a dele, quando levantou o olhar e percebeu que ele a olhava com uma expressão terna e doce. Ela estava com um olhar desolado. Ele a abraçou forte, e quando a soltou, passou a mão pelo seu rosto, e a beijou. Ainda podia sentir o gosto salgado das lágrimas que ela havia derramado.”